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Set17

Mercado imobiliário

Holding imobiliária com os dias contados

Uma das estruturas mais utilizadas em organização de patrimônios e planejamento sucessório, a holding imobiliária pode estar com seus dias contados em função da reforma tributária do ministro Paulo Guedes e de um julgamento kafkiano do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da imunidade tributária do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) sobre aqueles incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica.

A holding protege o patrimônio imobiliário, gera eficiência fiscal, e evita o condomínio, pelo qual cada proprietário detém uma parte ideal do imóvel todo, exigindo-se a unanimidade de decisões sobre o imóvel, o que pode incluir a outorga de cônjuges, causando desgastes e perdas de negócios. A holding proporciona a construção de uma estrutura de deliberações por maioria, sem a anuência de terceiros.

A CBS em substituição aos atuais 3,65% de PIS e Cofins provocará um incremento da atual tributação


Tomemos um exemplo corriqueiro: um casal detém imóveis destinados à locação, geradores de relevante receita mensal, bem como imóveis de uso da família (praia, campo), e três filhos casados.

Nesse caso, a alocação inicialmente imaginada, pelo menos até 5 de agosto deste ano, data do julgamento virtual do STF, seria a seguinte: a conferência dos imóveis de locação para uma holding e a conferência dos imóveis de uso para outra, pois a Constituição Federal determina que o ITBI não incide sobre a transmissão de bens incorporados ao patrimônio de empresa em realização de capital, salvo se a sua atividade preponderante for a compra/venda/locação desses bens. Ou seja, a holding que detivesse os imóveis geradores de renda locatícia deveria contribuir o ITBI, enquanto aquela destinada a deter os imóveis de uso estaria imune.

A conferência do imóvel para a pessoa jurídica equivale a uma alienação (troca-se o imóvel por quotas/ações) e pode ser feita pelo valor da Declaração de Bens (custo), sem a incidência do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre o ganho de capital, ou pelo valor de mercado dos bens, superior ao de Declaração de Bens, aproveitando-se dos tratamentos favorecidos que levem em conta a data de aquisição do bem, mas sujeitando-se o conferente ao IRPF sobre o ganho de capital (diferença positiva entre o valor de mercado e o de custo), com alíquotas progressivas de 15% a 22,5%.

Ocorre que no citado julgamento, o STF decidiu que a imunidade tributária do ITBI sobre os imóveis incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica não alcança a parcela desses bens que exceda o valor do capital social integralizado, e independe da atividade preponderante. Ou seja, se o conferente optar por utilizar o valor de custo do bem para integralizar o capital da holding, a diferença positiva entre o valor das participações subscritas e o valor venal (ou valor de referência) dos imóveis que exceder o capital integralizado deve ser tributado pelo ITBI.

Já com relação à holding dos imóveis de renda, o pagamento do ITBI sempre foi devido, mas encarado como um investimento, pois a tributação da receita de locação é atualmente menor na pessoa jurídica sujeita à apuração do lucro presumido se comparada à pessoa física, para a qual deve ser aplicada a tabela progressiva do IRPF (carnê-leão), que incide à alíquota máxima de 27,5% sobre a receita da locação. Na holding, o imóvel registrado no imobilizado de empresa cujo objeto social seja a atividade imobiliária e o regime de apuração seja o lucro presumido, a tributação incide à alíquota máxima de 14,53% sobre a receita da locação, o que consiste na soma das alíquotas dos tributos federais (Imposto de Renda, CSLL, PIS e Cofins). Ou seja, o “investimento” em ITBI é amortizável vis a vis a vantagem fiscal, sobrando um lucro líquido maior a ser distribuído entre os sócios da holding, sem tributação de dividendos.

Entretanto, a primeira parte da reforma tributária (Projeto de Lei nº 3.887/20) prevê a instituição da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS) sobre a receita bruta, em substituição ao PIS e Cofins, o que significará aumento da carga fiscal, ao menos no contexto aqui tratado, pois a CBS deverá ter alíquota uniforme de 12%. Não obstante o projeto conter possibilidade de crédito das aquisições de bens e serviços para apurar a CBS devida, uma holding imobiliária praticamente não possuirá créditos para reduzir o impacto do novo tributo, e a CBS em substituição aos atuais 3,65% de PIS e Cofins provocará um incremento da atual tributação total de 14,53% para 22,88%. Já há discussão nos meios acadêmicos se o valor do aluguel deveria ser tributado pela CBS em razão de não se enquadrar no conceito de receita bruta, mas não adentraremos nesse tema aqui.

E não para por aí: a terceira parte da reforma tributária deve conter mudanças ao Imposto de Renda e trazer de volta a tributação de dividendos ao cenário nacional, que em 1996 deixou de existir (artigo 10 da Lei nº 9.249, de 1995). Caso ela volte aos 15% como era até então, e considerando distribuição de dividendos do total do lucro, ter-se-á tributação total de 34,45% em relação ao valor da locação do imóvel detido pela holding até os dividendos pagos à pessoa física.

Nesse contexto, dificilmente as holdings prevalecerão. Levada pelo desejo de pagar menos imposto, a pessoa física manterá os imóveis em seu próprio nome. Ainda que se estruture a holding apenas com a nua propriedade dos bens para que a renda permaneça com a pessoa física, a solução será temporária pois o usufruto se extingue com o falecimento do titular, passando a renda da locação para a pessoa jurídica. E não há como celebrar um acordo de sócios e, na eventualidade do falecimento de um dos pais sem testamento, passarão os bens a pertencer em condomínio 50% ao cônjuge sobrevivente, e 16,66% a cada um dos filhos, e para a movimentação dos bens será necessária a unanimidade das vontades e, ainda, caso um dos filhos seja casado sob outro regime que não o da separação total, a vontade do cônjuge de filho deverá ser obrigatoriamente respeitada.

A pergunta que fica no ar é: como evitar o condomínio e criar regras de convivência se efetivamente a holding imobiliária estiver com seus dias contados?



Por Márcia Setti e José Henrique Longo